Um dos fenômenos mais importantes do ciclo natural de vida dos peixes e essencial para a manutenção das espécies em sucessivas gerações, a Piracema, corresponde ao processo de migração reprodutiva dos peixes.
O fenômeno ocorre anualmente entre os meses de outubro a fevereiro podendo ser antecipado ou estendido, de acordo com cada espécie.
Esta época coincide com os meses mais quentes do ano, o início das chuvas e a elevação do nível de água nos rios, condições necessárias ao estímulo biológico dos peixes, dando início assim, ao processo de maturação gonadal. Durante esses meses os peixes sobem até as cabeceiras dos rios, nadando contra a correnteza, para realizar a desova e a reprodução.
Este fenômeno é considerado essencial para a preservação da piscosidade das águas dos rios e lagoas.
Após a reprodução, os peixes realizam a “rodada”, a descida nos rios, no sentido favorável a correnteza, num processo de total rendição após exaustivo trabalho de natação rio acima. Juntamente com eles, descem alevinos e larvas até os locais de remanso, como as baias, onde encontram alimento e abrigo contra os predadores.
Todos os anos, varias espécies de pescado fazem esse longo percurso, vencendo os obstáculos naturais, como as corredeiras e cachoeiras, no impulso biológico para perpetuação das espécies.
Nesse percurso os peixes encontram obstáculos naturais e não naturais, alguns quase impossíveis de transpassar, um deles a pesca depredatória, feita pelo homem, com a utilização de armadilhas, redes, tarrafas, e outros artifícios, tem prejudicado o equilíbrio nas bacias hidrográficas, abrangendo aí além do seu rio principal, todos os corpos de água adjacentes, sejam eles afluentes, corixos, córregos, lagos, lagoas marginais, reservatórios e demais coleções de águas sob o domínio da União.
É importante salientar que tanto a fauna como a flora típicos das bacias hidrográficas, constituem recursos ambientais indispensáveis ao equilíbrio desses ecossistemas aquáticos e por isso a sua proteção, administração e fiscalização é de grande importância.
Por Lei decretou-se que durante a piracema é proibida qualquer atividade de pesca profissional, amadora ou esportiva, com a utilização de redes, tarrafas, covos e outras armadilhas que aniquilam a vida nos rios.
Apesar do rigor da Lei e da fiscalização, muitos ainda não entenderam a necessidade de respeitar a piracema. Não compreenderam o sentido biológico do processo, muito menos a importância que ele representa na manutenção dos estoques pesqueiros. Com isso, continuam praticando a pesca ilegalmente. Acrescido a isso estão os demais problemas ambientais que circundam as bacias hidrográficas e colaboram para o quadro desfavorável ao processo natural de manutenção da vida nas águas.
As condições favoráveis à reprodução e ao desenvolvimento de larvas e alevinos vão além da pesca nos rios, estando ligada também às boas condições física, químicas, biológicas, ambientais de todo o complexo ecossistema no qual a bacia esta inserida.
É a somatória de todos os problemas ambientais e os maus hábitos da população que acarretam, por consequência, a crescente falta de peixes a cada novo ano, podendo levar em um futuro próximo, a extinção de espécies.
Em se tratando de biodiversidade, os peixes são considerados bens comuns globais e, por esta razão, devem ser incorporados às políticas públicas visando o gerenciamento que concilie os interesses ambientais, econômicos e sociais. Por ser um recurso natural renovável e ao mesmo tempo finito, há a necessidade de se impor limites mais restritivos sobre a sua extração, visando à conservação deste recurso. Entre outros instrumentos públicos, o Estado institui anualmente o Período de Defeso da reprodução, um instrumento com características de manejo, utilizado para possibilitar a reposição dos estoques pesqueiros para os anos seguintes.
Sabe-se que a interação entre o popular e o científico é a base para o desenvolvimento sustentável. Mato Grosso possui uma imensa rede hídrica que em muitos locais serve como base de sustento e subsistência para comunidades tradicionais, colônias de pescadores e de suporte para o turismo no Estado. Manter o estoque pesqueiro está além de estabelecer limites e tamanhos de captura do pescado, bem como regular petrechos permitidos.
Acreditamos que com o comprometimento dos atores envolvidos na atividade pesqueira, bem como daqueles que legislam sobre ela, aliado a uma sólida base científica de informações obtidas nas atividades desenvolvidas nesta pesquisa, tenhamos um instrumento de suporte ao desenvolvimento de uma atividade sustentável.